Crônica: toró nas Itoupavas

Véspera de Natal, estávamos, eu, o Sabiá e o Bubby (que morava no alto da Gustavo Zallinger e cujo pai era motorista da “Auto Viação Catarinense”, sempre uniformizado e aprumado e a gente lhe admirava o uniforme como se fosse de um general) subindo o morro de mata fechada, ali ao final de uma rua inominada, bem no início da tal Gustavo e paralela aos trilhos da EFSC.

Eis que o céu escureceu mais que o normal, prenúncio de uma tempestade. Oba! Vamos tomar um baita banho de chuva (pensei) e prosseguimos em nossa missão de procurar ninhos de passarinhos.

Veio o toró com tudo de direito (e torto também). Trovões, relâmpagos, coriscos e água de baldada. São Pedro nesse dia caprichou. Como a água descia arrostando tudo e com medo de, mais que lavados, também sermos levados decidimos escalar uma grande árvore e aguardar os acontecimentos. Então, não mais que de repente, formigas, formigões e aparentados resolveram que aquela mesma árvore lhes serviria de valhacouto.

E agora, perguntou o Bubby e completou: “estou com medo, preciso ir ao banheiro”. Dito isso ele se afrouxou ali mesmo e conteúdo do “cagaço” (literalmente) escorreu tronco abaixo, ao encontro do formigueiro que ascendia desprevenido. Putz! A coisa só piorava. Mesmo que a chuvarada passasse continuaríamos retidos no alto daquela goiabeira gigante por um filete de “sobras” do Bubby e de formigas agora vingativas.

Decidi, então, me pendurar num galho que se estendia distante do tronco melecado e ocupado e tentar a sorte. Pac! O tal galho estalou e se partiu, desci à jato e dei com o costado no chão esmagando folhas e galhos. Nem as urtigas escaparam (que lá ficassem para o Bubby!). Mas o estrago em minhas costas foi maior. Doeu, fiquei alguns minutos, sei lá quanto, sem ar.

Mas moleque de nove anos é inquebrável e “imorrível” (até parece o cara que ocupa hoje a presidência). Respirei fundo, sentei, levantei e me mandei morro abaixo de roldão ou de Aroldão. Lama, pedras, entulhos e tudo o mais não me impediram de correr pra casa sem olhar pra trás. O cagão que se virasse.

E agora? O que dizer em casa? Afinal naquele dia eu prometera que ficaria somente no quintal de casa. Fui recebido por minha mãe, cujos olhos refletiam alegria em me ver, embora imundo, mais desgrenhado que nunca e molhado até os ossos. Ela bem que tentou colocar alguma feição severa e diante dos vizinhos sentenciou um castigo, que nunca foi cumprido.

Soube depois, que a vizinhança toda esteve à nossa procura. Até o uniformizado da “Catarinense” pai do Bubby. E percorreram a Rua Bahia das Gaitas Hering até a Ponte do Salto. Disseram que sumíramos por mais de quatro horas (pra mim foram poucos minutos).

Muito bem, o Sabiá está sempre comigo, aliás esse é o papel de um bom alter ego, mas do Bubby nunca mais ouvi falar. Talvez tenha se transformado num formigão ou viajou para alhures na Auto Viação Catarinense. Enfim a Itoupava-Seca sempre teve lá os seus mistérios.

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