Audiência Pública denuncia falta de políticas públicas de proteção e de apoio às mulheres

Foto: Denner Ovidio

A Câmara de Vereadores de Blumenau realizou na noite dessa quarta-feira, 18, uma audiência pública que debateu o tema “Legislação e Políticas Públicas para Mulheres, combatendo a violência e promovendo a cidadania”. O evento foi solicitado pelo vereador Roberto Morauer (PT), que representa o Mandato Coletivo, através do Requerimento Nº 566/2022.

Representantes de diversos coletivos feministas, de entidades governamentais que trabalham no combate à violência contra a mulher e também do Sintraseb, todas mulheres, estiveram presentes e usaram a tribuna para denunciarem  a ausência de políticas públicas em defesa das mulheres no município e a redução das mesmas em âmbito federal nos últimos anos. Também marcaram presença a vereadora e procuradora da Mulher de São Miguel do Oeste,  Maria Teresa Capra, e a ex-deputada estadual e suplente de deputada federal, Ana Paula Lima, ambas do PT.

A vereadora Silmara Miguel (PSD), vice-presidente da Câmara e procuradora da Mulher, abriu os trabalhos da mesa. Destacou a importância de debater o assunto, segundo ela, diante de casos diários que se apresentam de violência contra a mulher e feminicídio. “Deveríamos ter feito isso há mais tempo e cumprimento o vereador Roberto e o mandato pela proposição”, disse, ressaltando o trabalho desenvolvido pela Procuradoria Especial da Mulher, de forma dedicada e específica a cada mulher que procura pelo setor.  Em seguida pediu licença para se ausentar da audiência porque tinha uma outra agenda a cumprir. Também justificou a ausência da vice procuradora da Mulher,  vereadora Cristiane Loureiro (Podemos),

O vereador Roberto Morauer preferiu ceder seus tempo de fala para as convidadas e somente coordenou a audiência, esclarecendo que o microfone naquele momento pertencia às mulheres.  Ele lembrou que a data de 18 de maio traz uma reflexão a outra situação triste vivida no Brasil, referindo-se ao  Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes

A vereadora Maria Tereza Capra contou sobre seu histórico político com as questões relacionadas à defesa dos direitos da mulher.  Disse que são pelas histórias das mulheres que ela atravessa o Estado, como nessa noite, para falar sobre um tema tão importante. “Nosso propósito é melhorar a vida de todas as mulheres, mas também para que tenhamos um mundo com menos violência”, assinalou.  Também comentou sobre as políticas públicas, com muitos reais investidos, não chegam onde realmente precisam estar para mudar realidades.

Assegurou que tudo se faz coletivamente e que para isso é preciso ter coragem, determinação e articulação, porque sem essas três premissas não há avanços. “Se não ocuparmos os espaços de poder, organizarmos e ditarmos a pauta não temos como avançar.  Não podemos nos contentar com pouca coisa. No combate à violência não tem negociação”, ressaltou.

Destacou ainda a importância dos recursos da Lei Maria da Penha serem destinados para a formação de profissionais que atendem as vítimas de violência na hora das denúncias. “Há uma tendência de buscarem muito mais os motivos da violência do que propor caminhos para erradica-la”. Defendeu que a Lei Maria da Penha também deve ser discutida nas escolas.

Em seguida fez uso da palavra Alessandra Souza,  representante da Batucada Feminista de Blumenau. Disse que há muito tempo o grupo vem denunciando a significativa redução das políticas públicas por parte do governo federal e local. Enfatizou que é um fato que impacta a vida de toda a população, especialmente a vida das mulheres, sendo a maioria dessas políticas no mundo do trabalho e dos cuidados. “Temos denunciados sistematicamente as frágeis e muitas vezes ausentes inciativas públicas que respondam às necessidades das mulheres, principalmente as mulheres em situação de vulnerabilidade social”.

Disse que nos últimos anos o Plano Municipal de Políticas para a mulheres, norteador de outras políticas sociais, como saúde e trabalho e renda, tem sido ignorado e administrado com intenções apenas burocráticas e o que se vê na cidade é o aumento dos números de violência contra mulheres e meninas. Enfatizou que em toda crise social quem mais sofre as consequências são as mulheres e seus filhos. Afirmou que com a pandemia o governo federal acelerou a retirada de direitos e a realidade não é diferente em Blumenau.

A presidente do Instituto Nísia Floresta, Georgia Faust, apresentou os dados da violência contra a mulher no Estado, conforme dados da Secretaria de Segurança Pública de Santa Catarina. Disse que em 2021 houve 55 feminicídios  e até o momento, este ano, somam 24.  Alertou que o Estado exibe a vergonhosa marca de nove estupros diários. “Santa Catarina, tido como estado modelo por muitos é o segundo maior em número de violência contra a mulher, perdendo apenas para o Amapá”, salientou.

Criticou o fato de que uma cidade como Blumenau não ter um Conselho dos Direitos da Mulher, já que apresenta altos índices de violência contra a mulher. Ressaltou que um projeto de lei já está elaborado, mas que a proposta só vem sendo jogada de um gestor para outro, de um vereador para outro, desde 2015,  e que ninguém encampou a ideia. Disse que a surpreende o fato de que também as vereadoras mulheres não apoiaram a ideia até o momento. Assinalou que em 35 municípios catarinenses, o conselho já foi implementado.

“O conselho não vai mudar a nossa vida do dia da noite, mas muitos dos problemas apontados hoje pela Bancada Feminista poderiam ser resolvidos por um conselho”, alertou, assegurando que as mulheres seguirão na luta, independente do machismo que impera para que elas voltem à cozinha. “Não será assim pra sempre. Nós nunca mais voltaremos para cozinha. Seguimos na luta incansáveis”, asseverou.

Representando o Sintraseb, Cleide de Oliveira, que integra o mandato coletivo, ressaltou que os sindicalistas perceberam o aumento da violência no mundo do trabalho, principalmente contra as mulheres, assim como a violência de gênero e o assédio moral e sexual. “E não temos encontrado no Executivo Municipal e nem mesmo nesta Casa Legislativa acolhida a tudo para aquilo que as mulheres que me antecederam aqui já disseram”, criticou.  Assinalou que o Sintraseb vem debatendo o tema com a categoria e lembrou que o sindicato trouxe o debate sobre gênero para ser incluso no Plano Municipal de Educação, mas que na época, o assunto foi retirado do documento.

A vice coordenadora do Comitê Permanente da Rede de Atenção Integral às Pessoas em Situação de Violência Sexual, Doméstica, Familiar ou Institucional de Blumenau. Teresinha Nogueira, explicou o trabalho desenvolvido pelo órgão e como o mesmo foi formado.  Disse que o comitê reúne cerca de 30 entidades governamentais e não-governamentais e que seu objetivo é articular a rede se serviços de proteção no município. Disse ainda que ele foi oficializado em 2021 por um decreto do prefeito, mas que o movimento pela oficialização existe há 20 anos.

Ressaltou a importância do Conselho Municipal de Direitos da Mulher . “Precisamos de dessa força política para ativar o conselho no município, se não o nosso trabalho não tem visibilidade e esse ano o comitê faz 20 anos e não conseguimos dar visibilidade”.

Comentou sobre os avanços do trabalho, mas que ainda há muito para avançar no combate à violência no município. Disse que o comitê age depois que os fatos acontecem e que é necessário campanhas de prevenção.

Em seguida usou a tribuna a coordenadora da Rede Catarina em Blumenau, aspirante a oficial da Polícia Militar, Vitória Mattos Malassise. Comentou que a Rede Catarina é a porta de entrada para o enfrentamento da violência, mas que a PM deveria ser a última instância a ser acionada, porque isso significa que a violência já aconteceu.  Assinalou que isso é reflexo da falta de políticas públicas especificas para as mulheres e que a educação é  caminho, defendendo que o tema da violência contra a mulher deve ser debatida nas escolas.

Após falos a ex-deputada Ana Paula de Lima, que destacou que sem o apoio de políticas públicas é possível compreender o porquê de muitas mulheres não conseguirem romper com o ciclo da violência. “Muitas mulheres vão optar por voltar a fase da agressão se tiverem seus filhos passando fome”, explicou, enfatizando que se muitas voltam é porque não há atendimentos adequados.

Lembrou das várias violências das quais as mulheres sofrem e disse que são as primeiras vítimas das consequências de uma crise econômica, política, religiosa, ou de qualquer outra, entre outras.  “O diagnóstico nós sabemos, mas agora temos que fazer as políticas publicas porque a violência contra a mulher gera a violência contra toda a sociedade”, salientou.

Encaminhamentos

Os presentes decidiram pela formação de um Grupo de Trabalho para revisar o texto do projeto que cria o Conselho Municipal de Direitos da Mulher, que após será encaminhado ao Executivo. Também apontaram a necessidade de um fórum permanente de discussões sobre o tema da violência contra a mulher e políticas públicas relacionadas.

Outra proposta apresentada foi a de trazer para o Legislativo novamente o debate sobre a questão de gênero ser levada para dentro das escolas.  A recomendação foi do coordenador do Sintraseb, Sergio Bernardo, que defendeu que o debate da questão de gênero e da violência de gênero deve ser levada como uma política pública para dentro das unidades escolares.

O vereador Roberto Morauer assegurou que trabalhar o tema na educação é fundamental para buscar a mudança da situação atual de violência que se está discutindo há décadas e que esta deve ser debatida dentro do Legislativo.

Os participantes da audiência também querem informações do Executivo sobre os grupos sócio-educativos de homens agressores  e pediram pela ampliação dos mesmos frente a demanda de casos na cidade. Georgia Faust disse que esses grupos merecem ser implantados em mais unidades de saúde.

O representante da comunidade, Rafael, sugeriu que nos eventos turísticos haja mais divulgação e esclarecimento sobre a violência e assédio sexual.

Fonte: CMB

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