Eu tenho um sonho, disse um inspirado Martin Luther King, em 28 de agosto de 1963. Tudo que ele imaginava, naquele instante, ganha eco, ao longo dos dias, no coração de muita gente boa. Caminhamos para comemorar 60 anos daquele que é considerado um dos melhores e mais importantes discursos para história da humanidade. O envelhecer do tempo, a chegada de novas formas de difundir as mensagens, de marcar posições, esvaziaram a força que faziam de pronunciamentos de um cidadão o rítmo de uma causa, de uma bandeira. Ou, sabe-se lá, foram os grandes líderes que sumiram mesmo.
Os profundos discursos surgiram muito antes de Dr. King marcar seu nome na história. É preciso um mergulho no passado, uma viagem até Saracusa, para encontrar fragmentos dos pais da retórica. Tísias, Córax, Aristóteles, Crasso, Isocrates, Julio César, tiveram tanta potencia em suas palavras que nem mesmo a morte de séculos apresentou borracha capaz de apagar aquelas ideias.
Um processo político eleitoral, como hoje vivemos no Brasil, é o período que a voz, destes que lideram projetos de poder, são emprestadas para construir a história. Cada página, cada apresentação pública, cada encontro, é uma oportunidade de acrescentar mais emoção, argumento e motivos para atrair outros seguidores para o ponto de vista que defendem. E, neste momento, parece que a disputa brasileira de 2022 está cega de ódio, em uma luta pela liderança de classe da 5° série B.
Nem tanto pela qualidade de fala de alguns dos candidatos a presidência, mas, por gestos, mensagens, desrespeito e falta de conteúdo. A qualidade caiu muito no debate público e os temas que importam para a coletividade ficou – perdoe-me a pobreza de elegancia narrativa – sem grande importância. Hoje, o discurso é mais uma arma de ataque e desconstrução, como combustível para a raivosa multidão infantilizada.
Ao fim de todo pronunciamento dos candidatos, ao meu ver, parece até que os eleitores são transformados máquinas prontas para rotular adversários. Explorando, da pior forma, o poder de conquista e retenção da atenção de outros.
Gosto de imaginar o que diriam os maiores exemplos de oratória da humanidade sobre o nosso tempo. “Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos”, responderia prontamente Churchill.
“Digo a vocês hoje, meus amigos, que, apesar das dificuldades de hoje e de amanhã, eu tenho um sonho. Não podemos caminhar sozinhos. E, enquanto caminhamos, precisamos fazer a promessa de que caminharemos para frente. Não podemos retroceder. Não tentemos saciar nossa sede de liberdade bebendo do cálice da amargura e do ódio. Essa é nossa esperança. Com esta fé podemos trabalhar juntos, orar juntos, lutar juntos, ir à cadeia juntos, defender a liberdade juntos, conscientes de que seremos livres um dia”, conclamaria, do alto de uma escadaria, o negro Luther King.
Seja o primeiro a comentar