Já foi afirmado pelo memorável Darcy Ribeiro que, “a crise na educação brasileira não é crise, é projeto”. Cabe aqui uma reflexão sobre esta declaração, afinal de contas crise, por quê, para quem, e em benefício de quem? Por quê este projeto é algo sobre o que se deve refletir, e o que o cidadão “normal” tem haver com isso?
A reflexão é relevante afinal de contas, se costuma, corriqueiramente ouvir a declaração de muitas pessoas, após já terem passado pelas salas escolares, declarações que afirmam que: “no meu tempo era diferente”, ou ainda, “boa era a escola do meu tempo”, além de: “deveríamos voltar à aquele modelo de escola, afinal, aquele sim, era bom”.
Estes tipos de comentários geralmente costumam se referir a questões comportamentais dos alunos, afirmando que, as crianças e adolescentes contemporâneos carecem de padrões morais adequados. Se este é o centro de um debate (muitas vezes deixando a questão de conhecimento de lado), talvez se deva questionar não somente a escola, mas também, a família.
Afinal de contas, a educação é uma ação, uma caminhada rumo ao conhecimento que se constrói de modo coletivo, no seio da sociedade, não se tem notícias de formas eficientes de conhecimento que sejam desenvolvidas de maneira plena no claustro do isolamento. Isso acontece, em grande parte pelo fato de que aprender, costuma ser um processo no qual, em algum momento, possam existir dúvidas.
Nesta direção, se ouve muitas vezes, muitos pais dizendo “mas professor, nesta idade, eu já era possuidor de determinados conhecimentos, cálculo, noção de horário, respeito”, dentre outros comentários corriqueiros. Eis que, neste momento, cabe ao professor o questionamento que se deve fazer aos pais, “e seus pais, como lhe motivavam a busca pelo conhecimento, ao estudo?”
Este texto, de modo algum quer ser um texto de defesa de um professor, que visa realizar uma crítica parcial, afinal, o próprio professor é pai. A intenção é promover uma reflexão sobre as mudanças que a sociedade passou nas últimas décadas, onde o avanço dos meios de comunicação promoveu uma verdadeira revolução humana.
Nesta revolução da forma de lidar com o mundo ao redor, as formas de pressão se tornaram maiores, além de uma série de efeitos emocionais relacionados. A pressão por resultados, seja no desempenho das atividades realizadas a bastante tempo, seja pela pressão de incorporar a capacidade de executar novas funções neste novo mundo digital.
Mas, aqui cabe se fazer uma linha de separação que é fundamental. Há uma diferença colossal entre lidar com o mundo digital, ou seja, com as novas tecnologias, e tonar-se um viciado em dispositivos eletrônicos, de modo vazio e despropositado. Afinal de contas, se a revolução digital permitiu um acesso esplendido ao conhecimento, também trouxe muitas diversões vazias.
A alegação de que o mundo digital é um elemento fundamental para a construção do conhecimento é um elemento bastante delicado e deve ser conduzido com muita lucidez. Afinal de contas, a parafernália digital pode sim auxiliar na construção do conhecimento. Mas auxiliar, não significa transformar magicamente, afinal tecnologia é técnica, não milagre.
Não há como um tablet ensinar uma criança a ler, ou a fazer cálculos matemáticos, apenas pelo fato de receber tal dispositivo de seus pais. A prática da leitura, da interpretação, bem como o desenvolvimento lógico, fundamental à matemática, são atividades que exercem prática, e por certo, repetição, que costuma ser uma ação que nem de longe costuma ser prazerosa.
Neste novo e desafiador panorama da realidade, a participação familiar, aliada a atividade formal exercida pela instituição escolar, é fundamental. A eventual substituição do caderno pelo bloco de notas do celular, pode ser uma forma nova, e talvez, funcional de registro de informações, mas em algum momento, a escrita, será necessária, sem o acessório de um corretor instantâneo.
É curioso que, muitos dos adultos, com seus comentários citados no início deste texto, são saudosistas por um modelo mais inflexível de gestão humana, não raro, são os mesmo que, não cumprem a disciplina mínima, trocando mensagens instantâneas através de redes sociais com seus filhos, em pelo horário de aula, sobre temas dos mais diversos.
Esta presença constante, demonstra muito fortemente a insegurança que se percebe na vida da contemporânea. Hoje conhecemos problemas de violência que são existentes na sociedade desde que o ser humano vive em sociedade, mas os meios digitais de comunicação, geram grande insegurança. Mas há que ser tem bom senso ao interpretar este tipo de informação.
De modo que os meios digitais, são uma realidade, da qual não se consegue fugir, por mais que se queira. Assim, há sim uma necessidade de transformação do espaço escolar, mas esta transformação só será eficiente se, as famílias são partícipes deste processo, que precisam compreender que, um celular é muito interessante, mas, a frase que “um país se faz com homens e livros”, ainda vale, mesmo que o livro seja PDF ou e-book.
Este texto não teve em nenhum momento promover um caminho seguro rumo à uma noção educacional, muito menos afirmar o protagonismo do fracasso educacional, atribuído à família ou escola. A crise no processo educacional é um projeto que tem por objetivo de fazer a pessoa menos racional, mais mecanizada, de reduzida capacidade racional. E para reverter este processo, é necessário mais do que nunca, uma ação cooperativa entre a instituição de ensino e família, em favor de uma sociedade melhor.
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