Platão (428-348 a.C.), é um dos pensadores mais estudados na História da Filosofia. Seja pela grande quantidade de temas sobre os quais ele veio a realizar suas reflexões, seja por ter sido um dos autores que preservou por escrito, o pensamento socrático, do qual, Platão é um dos herdeiros. O pensamento platônico tem grande relevância, pela capacidade que este, conseguiu expressar suas reflexões, de modo atemporal.
Desta forma, ao lecionar para os estudantes que estão iniciando a interpretação do pensamento filosófico, há diversas expressões que demonstram, já na contemporaneidade do autor. Na Grécia Antiga, com diversos aspectos que podem ser encontrados no século XXI. A racionalidade do pensamento grego, em larga medida, foi comprovada mais de mil anos depois, com o desenvolvimento das diversas áreas da ciência.
Pensadores como Platão, dentre outros pensadores desde a Grécia Antiga até meados do século XIX, eram chamados de universalistas, por conta da grande quantidade de temas que estes intelectuais abordavam. Parte deste pensamento, ficou na esfera dos estudos dos filósofos, mas algumas reflexões foram adotadas na matemática, na biologia, dentre outras áreas do conhecimento, que não estão ligadas direta e formalmente com as humanidades.
Nesta crônica, será feita uma reflexão, sobre uma expressão, encontrada em um momento do pensamento platônico, buscando observar, que esta curiosa expressão, apesar de tão antiga, compreende muito do humor humano. Ao que parece, Platão reconhece um elemento físico, ou melhor, uma região do corpo humano, que possui um grande poder de influenciar o humor humano que, portanto, determina muito da forma de agir e interagir das pessoas.
É possível perceber que, a compreensão dos aspectos emocionais do ser humano, passa por reflexões a bastante tempo, observando-se que Platão faz suas observações mais de duzentos anos antes da era cristã. Evidentemente que, a ciência buscou aperfeiçoar, melhorar e expandir suas pesquisas, comprovando e muitas vezes, superando o pensamento que lhe era anterior. Mas muito destas visões, foram apenas, revisadas, aprofundadas e comprovadas.
Feita esta contextualização, se parte para a expressão que, como comentado, apesar de antiga, pode apresentar uma forma interessante de compreender parte do comportamento humano. Platão, buscando compreender uma parte emocional (pertencendo ao universo racional, defendido por este pensador), percebendo que, uma região específica do corpo, apresenta, grande influência nas aflições humanas.
O filósofo encontrou no baixo ventre, uma potência de transformação do aspecto emocional humano. Ele nomeou como aflições do baixo ventre, a determinante influência que uma desregulação nesta região, como preponderante para o que veio a se chamar de mal humor. Onde a falta de regulação no bom funcionamento das funções desta região, implicariam em aspectos considerados negativos do humor e, consequentemente, das ações humanas.
Quando se observa algumas expressões, que são presentes no vocabulário, é possível observar um aceno, ao que deduziu Platão. A expressão enfezado, pode ser uma boa demonstração deste contexto, afinal, se costuma empregar o termo, para alguém aborrecido ou irritado. Mas este termo, sinaliza também à um elemento escatológico, ao funcionamento intestinal, uma constipação intestinal que, deixaria o indivíduo enfezado, ou seja, aborrecido.
Observa-se que, as funções intestinais estão, no baixo ventre. Assim como também se encontra nessa região, os órgãos das funções urinárias que, caso também tenham algum tipo de desregulamento, causam incomodo ou aflição, consequentemente, influenciando diretamente o humor da pessoa. Desta forma tanto o sistema escatológico, quanto o urinário, parecem ter realmente uma participação no ânimo humano.
Mas há outro aspecto que, parece tão preponderante no elemento emocional humano. Um elemento que, ao mesmo tempo é biológico, como também psicológico, e que, em grande parte, foi motivador de boa parte das reflexões de Sigmund Freud (1856-1939), a sexualidade. De modo que, não necessariamente o funcionamento dos órgãos, mas a realização emocional na prática sexual, representam fortemente influência psicológica.
As três funções orgânicas citadas, apontam que a reflexão platônica apresenta grande assertividade em suas conclusões, visto que, são poderosos motivadores, ou desmotivadores emocionais. Estes, que, são observados no comportamento humano durante seu amadurecimento. Aspectos relacionados ao funcionamento dos sistemas, urinário e escatológico, se apresentam como influentes durante a vida, e o sexual, conforme o amadurecimento.
Assim, as reflexões realizadas por Platão, apresentam elementos que vão além do que os alunos costumam lembrar das alegorias presente em A República. Passando por elementos de autoconhecimento, de compreensão racional do próprio organismo, de seu funcionamento, bem como a importância do cuidado para com o corpo e seu funcionamento é algo que deve ser encarado com importante no amadurecimento da pessoa de modo mais amplo, completo.
Pode-se concluir, a partir da reflexão acerca da potência da referida região do corpo (no baixo ventre), que muitas das ações que refletem o humor, positivo ou negativo das pessoas, pode encontrar uma resposta simples. Talvez o grande mérito de Platão, seja ter encontrado uma explicação funcional, para compreender as atitudes de pessoas que, são visivelmente indispostas com a vida e o mundo, o sofrimento pelas “aflições do baixo ventre!”.
Prof. Jairo Demm Junkes, Historiador, Filósofo e Professor de Filosofia da Rede Pública Estadual de Santa Catarina e da rede privada.
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