O tempo vai avançando e os maiores dramas vividos na cidade, com o passar dos dias, perdem-se na memória. Ontem sentíamos profundamente abalados pelo o impacto da natureza. Tudo que Blumenau e região viveram em 2008, com morros transformados em rios de lama, parece, pouco mais de 14 anos depois, um pequeno transtorno, distante, como o drama que assola nestes dias o litoral de São Paulo. Tudo faz crer, falsamente, por nosso comportamento, ações, que os desastres nunca mais voltarão para realidade dos moradores do Vale do Itajaí.
Seguimos todos, atualmente, como se a dor, ainda sentida o coração daqueles que perderam um amigo ou familiar, não existisse mais. Assistimos a força da natureza destruir o lar de pessoas, nas diversas classes sociais, roubando a existência de um jeito brutal, tornando qualquer um em sujeito frágil. E ver, na tela, nas páginas dos jornais, de certa maneira é como compartilhar nossa impotência diante do caos do acaso. Afinal, o que aprendemos nas diversas vezes que história levou a paz, o patrimônio e a vida?
Em 2009, meses depois da maior tragédia que passou na região, ainda emocionalmente envolvido com tudo que passamos, decidi cursar “Comunicação de Riscos e Desastres”, uma iniciativa da Universidade Federal de Santa Catarina em parceria com a Defesa Civil do Estado. Desde então o mundo foi transformado por novas ferramentas de interação social e boa parte dos manuais perderam sua serventia, ou tornaram-se lentos para conversar, avisar e permitir salvar aqueles que precisam de ajuda.
Em São Paulo, por exemplo, que como nós possui uma Defesa Civil eficiente, treinada e comprometida, um dos desafios foi justamente em comunicar a população, ativando seu plano de contingência para as encostas das cidades de São Sebastião, Bertioga, Caraguatatuba, Guarujá, Ilhabela e Ubatuba. Será que por aqui, diante de tamanho volume de chuvas, evitaríamos um número tão grande de mortes?
Como mitigar a destruição de sonhos e esperanças quando a terra derrete, arrastando tudo no caminho? Do que adianta utilizar mensagens que dependem de internet quando as torres de celular vão ao chão? A implantação de sirenes em locais destacados como de solo instável poderiam evitar uma tragédia?
Entre tantas perguntas a certeza, um consenso entre pesquisadores e especialistas do tema: identificar e evitar a ocupação de locais de riscos. Neste contexto, causa estranheza que o município permita que novas edificações, em terrenos que podem sofrer escorregamentos de terra, sejam aprovadas, como o prédio desejado na rua Ingo Hering, que em 2008 registrou um grande deslizamento que invadiu o shopping e ainda hoje é apontado como área de perigo médio.
Talvez seja o tempo de Blumenau pensar na criação de um museu e memorial sobre os desastres naturais. Mais que lembrar e honrar a contribuição daqueles que fizeram para aprimorar nossa defesa, dos que partiram em função das tragédias, serviria para manter viva todas as cicatrizes e lições que aprendemos.
O Memorial do Holocausto, em Berlim, Alemanha, e o Memorial e Museu Nacional do 11 de Setembro, em Nova York, nos Estados Unidos, são referências de como um espaço pode gerar reflexão e aprendizado sobre um evento trágico da história. Homenageando as vítimas de tragédias e conscientizando as gerações futuras sobre a importância de prevenir e responder rapidamente a situações de emergência.
Assim como esses memoriais, a criação de um por aqui, garantiria que as histórias e lições não sejam esquecidas. É um legado que pode ser deixado para as gerações futuras, para que aprendam com os eventos daquele período e estejam melhor preparadas para lidar com situações semelhantes no futuro. Quem sabe o Parque São Francisco, no coração da cidade, seja o local ideal para construção, não da exploração imobiliária, mas de honra, homenagem, memória e ensinamentos sobre a prevenção aos desastres ambientais e climáticos.
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