“Nunca pague pela complexidade da apresentação quando tudo de que você precisa é de resultados”, diz Nassim Taleb, um dos maiores pesquisadores sobre fragilidades e incertezas deste mundão. O líbano-americano, que não gosta muito da academia por acreditar inócua boa parte dos estudos desenvolvidos em universidades, também mantém um certo desprezo por comunicadores com perguntas idiotas e conclusões toscas. Convenhamos, ele possui lá suas razões em alguns casos.
Na semana passada escrevi ao Informe Blumenau um pouco dos problemas da Internet, especialmente o risco que corremos em permitir que as grandes empresas dominem a gestão e o debate público. Infelizmente, logo na segunda-feira, voltamos a ser lembrados que a barbárie não espera o amadurecimento da sociedade para acontecer. Novamente o país chorou um ataque à escola.
O decorrer dos dias também trouxe uma matéria muito boa do repórter da NSC, Paulo Batistella, sobre os políticos tiktokers, o que parece ser uma tendência para todos que possuem ou desejam um cargo que depende do voto. Curiosamente, o destaque da produção está em nomes ligados a direita. Dos prefeitos, que recheiam os parágrafos, todos são do PSD. Uma opção editorial, talvez nem foi algo pensado como intencional. Respeito, embora acredito que ganharia o texto em pluralidade ao buscar para história outros nomes e ideias de outras correntes ideológicas. Mas, este não é o foco que quero ressaltar…
Trazendo o perfil de alguns gestores e legisladores catarinenses, que utilizam as ferramentas de rede social com a linguagem própria da plataforma pertencente aos chineses comunistas (rsrs, desculpe o destaque para esta ironia), o TikTok, o conteúdo da NSC encaminha o leitor para a ideia de convergência formada exclusivamente para esta nova maneira de comunicar, buscando aproximar o povo daquilo que são os feitos de um mandato. Sinceramente, se o fluxo carrega todos para um mesmo lado, arrisco contrariar o seguir da correnteza. O que desejo chamar a atenção, que evidente não se esgota aqui, nestas linhas, diz respeito a três pontos: os efeitos desconhecidos das redes e infantilização do discurso público; a promoção pessoal do mandatário; as secretarias municipais de comunicação.
Vamos lá:
Embora a comunicação tenha avançado e democratizado o alcance da voz nos últimos 10 a 15 anos, tateamos no escuro, ainda, sobre a compreensão e extensão de tudo que envolvem redes socias, o que inclui a influência não humana dos algoritmos. A sociedade – a minha e algumas gerações – atravessa um momento extremamente superficial na maneira que aborda, enfrenta, as coisas complexas. O que é muito ruim, não apenas para informar os assuntos que a dureza da vida impõe. Mas, por evitar mergulhar profundamente, permitindo encontrar e trazer para superfície um pingo de luz, sabedoria e um tanto silêncio, frente as gritarias, oferecendo soluções aos problemas difíceis de nosso tempo, como o diálogo e convergência de opostos.
O pesquisador Mário Vargas Llosa exemplifica, em seu livro “A Civilização do espetáculo”, que a política percebeu rapidamente o benefício de utilizar os novos meios de comunicação para atingir seus objetivos. “Essa louvável filosofia teve o indesejado efeito de trivializar e mediocrizar a vida cultural, em que certa facilitação formal e superficialidade de conteúdo dos produtos culturais se justificavam em razão do propósito cívico de chegar à maioria. A quantidade em detrimento da qualidade. Esse critério, propenso às piores demagogias”.
Além disso, o ego de um indivíduo é estimulado, testado, a enésima potência em cada recorte de vaidade publicado nos perfis. A hiperexposição das pessoas e quais os efeitos que esta voluntária repetição de imagem pode provocar em nós e nos outros a longo prazo, por exemplo, também são desconhecidos. Existe, ainda, a caricatura que transforma a seriedade necessária em brincadeiras que beiram o infantil, diminuindo muito o cargo, a política, a função pública de servir ao mero ato de entreter, uma reprodução moderna dos antigos bobos da corte.
Assim como as ferramentas seguem evoluindo, a forma de relacionamento na Internet também continua amadurecendo, mudando. Como ondas, várias são as tendências que surgem distantes, anunciadas revolucionárias , chegam fazendo espuma e, logo em seguida, desaparece deixando uma calmaria como se nunca antes passaram por nós.
O que desejo dizer, neste ponto, é para deixar o ímpeto juvenil um pouco de lado. Um dia um amigo jornalista deixou uma lição mais ou menos assim: “melhor que um bom conteúdo é a sabedoria dos cabelos brancos”. Calma jovem! O grego pré-socrático, Heráclito, dizia que “nada é permanente, exceto a mudança”. E eu complemento lembrado que, atualmente, nada se perde na memória das redes. Nós, porém, necessariamente mudamos nossa visão e convicções sobre os fatos que se apresentam ao longo do tempo. Portanto, ao homem público é necessário o cuidado em preservar a imagem e a coerência como preponderante para atingir resultados amanhã e depois, ou depois, de amanhã.
Se um parlamentar precisa, obrigatoriamente, utilizar da sua estrutura pública para valorizar o seu trabalho, tenho sérias dúvidas sobre o modelo escolhido por chefes do executivo. É inapropriado usar servidores, obras e ações de governo para fazer do erário um banco imobiliário que sustenta a publicidade do indivíduo. É uma forma de corrupção que desvia dinheiro na cara de todos com um carimbo institucional. Custear a promoção pessoal do gestor da ocasião é crime. A lei diz isso! Em um Brasil normal o correto seria a punição. Isso provoca uma distorção democrática, tornado o desejo de alguém desalojado do poder em um desafiante frágil e vulnerável.
O correto seria que o político investido de cargo público pudesse contratar, com seu próprio dinheiro, ou com recursos partidários, a sua equipe de comunicação. Separando os que defendem e cuidam de toda institucionalidade, daqueles que tratam da área política e imagem pessoal do eleito. De forma prática, o perfil pessoal de presidentes, ministros, governadores, secretários e prefeitos não poderiam contar com nem um trabalho de servidores.
Neste caminho, as secretarias de comunicação, especialmente as municipais, deveriam ser reformuladas – até mesmo extintas -, ligando toda estrutura ao gabinete do chefe do executivo. Localmente os veículos de impressa tradicionais perderam espaço, reduziram suas equipes e demandam menos importância, como ponte, entre o público e governos. Além disso, secretarias de comunicação atualmente não propõe política alguma de promoção da cidadania, fortalecimento de mercado, ou aprimoramento de espaço de fala local.
Com o diálogo mais próximo do cidadão, por meio das diversas ferramentas, a tarefa de comunicação é basicamente destinada a divulgação de governo. O que restringe muito a função de uma secretaria. Seria mais prudente que, para grandes eventos e projetos específicos, a exemplo do que já ocorre com a publicidade, que concorrências públicas fossem produzidas para a realização mais eficiente da função, otimizando equipes da carreira pública, permitindo mais gestão do conteúdo e contratando a produção.
Ou seja, não precisamos da complexidade das dancinhas infantiloides, de gestores tiktokers, de uma grande sacada iluminada. Para avançar a comunicação entre políticos, governos e sociedade é preciso compreender que as formas de trabalho e a estrutura precisam ser repensadas, todos os dias, com tranquilidade, distanciamento, profundidade que as telas, os views e likes são incapazes de garantir.
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