Sobre dirigir bêbado

Luiz Carlos Nemetz

Advogado

 

Salvo as exceções de estilo, a grande maioria das pessoas vivem, aqui no Brasil, em estado de liberdade. Pelo menos no conceito mais clássico e em sentido amplo.

Então, cada qual pode fazer as escolhas do seu caminho, seguir por ele e arcar com as consequências das suas escolhas. Homens e mulheres que fazem sexo, podem gerar uma vida. Quem gasta mais do que ganha, fica endividado. Quem fuma, tem mais propensão para ter menos saúde. Quem usa droga, se sujeita à dependência.

Quem consome álcool antes de dirigir, se expõe a sérios riscos de causar acidentes. E, quando as desgraças acontecem, a possibilidade e probabilidade de causar grandes danos, lesões, vítimas e mesmo mortes, é aumentada de forma absurda. Então, todos somos livres para escolher dentre outras, uma das seguintes opções: beber e dirigir; ou beber e não dirigir; ou, não beber e dirigir.

Quando ocorrem as tragédias envolvendo motoristas embriagados que causam acidente de trânsito, há o resultado trágico amplamente esperado que é o fruto de opção livre de quem a fez.

Segundo dados divulgados pelo seguro DPVAT,  mais de 50 mil pessoas morrem todos os anos em acidentes de trânsito no país. São 136 mortes por dia, cinco por hora. Isso sem contar quem fica com sequelas físicas e psíquicas permanentes. O custo para a sociedade é incalculável.

Um terço desses acidentes tem envolvimento com motoristas que ingeriram álcool e/ou conduziram veículos sob a influência substância psicoativa que determine dependência (o chamado “arrebite” usado por motoristas de caminhão é um deles).

Esses números são de uma guerra civil.

Tenho visto pessoas esclarecidas fazendo uma defesa enviesada e vesga de motoristas que dirigindo alcoolizados causam acidentes e estraçalham vidas, sob o argumento indireto da aplicação da parábola bíblica da mulher adúltera, que diz mais ou menos assim: “atire a primeira pedra, quem não tiver pecados”.

É um raciocínio torto, conservador, maléfico, inconsequente, retrógrado, imprudente, perverso e atrasado.

E outros vão ainda mais longe, argumentando: – “Mas beber e dirigir é da cultura do brasileiro!”. Nada mais obsoleto e superado.

Se essa foi a cultura até aqui, que seja imediata e prontamente alterada.

Há cerca de uma década tínhamos a cultura da propaganda e do incentivo maciço do consumo de tabaco. Se fumava nas salas de aula, nos aviões, nos shoppings, nos escritórios. Pouco a pouco foram sendo editadas leis proibindo a propaganda de cigarros. E hoje, fumar é antissocial.

O Brasil, aliás, foi pioneiro na mudança deste “costume”, tendo sido um dos primeiros países a proibir a veiculação de propaganda de cigarros em revistas, jornais, rádio e televisão. Me lembro do escândalo que foi quando a Formula 1 quis peitar essa determinação, que na época foi tida por reacionária. Com o tempo a coerência venceu a grana.

Pois bem, a guerra entre o conservar e o mudar deu um grande salto nesta semana, com relação a maléfica companhia entre consumo de bebidas alcoólicas e substâncias psicoativas que determine dependência e a direção de veículos automotivos.

É que finalmente o Brasil deu um passo adiante para mudar o cenário e a cultura do uso de bebidas alcoólicas e de substâncias psicoativas que determinem dependência por parte de motoristas de veículos automotivos. Entrou em vigor no dia 19 de dezembro último a LEI Nº 13.546. A partir da vigência desta nova lei, o simples ato de dirigir embriagado e/ou “chapado”, já caracteriza tipo penal com previsão de pena de reclusão, de cinco a oito anos, e suspensão ou proibição do direito de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor, quando houver acidentes com morte. A nova Lei prevê, ainda, a pena privativa de liberdade de reclusão de dois a cinco anos, sem prejuízo das outras penas, se do crime resultar lesão corporal de natureza grave ou gravíssima.

Além dessas modificações, o novo texto legal também caracteriza como conduta criminosa grave, “participar, na direção de veículo automotor, em via pública, de corrida, disputa ou competição automobilística ou ainda de exibição ou demonstração de perícia em manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade competente, gerando situação de risco à incolumidade pública ou privada”.

Aos poucos, os bebuns assassinos e os condutores irresponsáveis, vão começar a sentir a mão forte da lei. E, na linha do tempo, as estatísticas cruéis vão diminuir. E chegará o dia em que, nas rodas sociais, os idiotas que hoje defendem a flexibilização do julgamento destes condutores desajustados e marginais, vão ouvir as pessoas dizerem: “- Eu sou do tempo em que se podia beber e dirigir, que não dava nada!”.

De agora em diante o consumo de “cana”, dá “cana”

1 Comentário

  1. Muito bom. Vamos continuar lutando para chegar o dia que as pessoas vão se revoltar ao verem alguém consumir álcool e e diregir, e vão tomar atitudes na hora.

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