O processo em curso de afastamento do governador Moisés (PSL-SC) faz lembrar comparações e clichês. Seus erros serão perdoados no confessionário, por familiares e velhos amigos longe do poder, mas não na política, onde boas intenções jamais compensam maus resultados. Será vítima de interesses patrimonialistas e do abandono de eleitores de mãos lavadas. Suas decisões não serão perdoadas pelos que o elegeram e os políticos não perderiam a chance de armar essa arapuca, autorizados por eleitores fiéis ao “Mito”.
Um livro do jornalista Chico Gois ilustra parte do problema. Intitulado “Os Ben$ que os Políticos Fazem: histórias de quem enriqueceu durante os mandados” (Editora Leya”, 2013), o livro revela para que servem as CPIs no estado do Rio de Janeiro: encurralar o Executivo e barganhar fatias do patrimônio público para enriquecimento pessoal. No caso de Moisés, como talvez do próprio Witzel (PSC-RJ), não é o caso de barganhar, é de tomar o poder e reaver um valioso patrimônio público (cargos, salários, contratos, favores e uma infinidade de prebendas).
Antropologicamente, Santa Catarina é diferente daquele estado. Por razões de cultura e constituição da pequena propriedade, nos tornamos um povo diferente, meio esquecidos, graças a Deus, enquanto durou. Nossas instituições informais (costumes, comportamento, individualismo e independência em relação ao Estado e a coronéis são relativamente distintas do padrão carioca e nacional). Mas, quanto às instituições formais (leis, burocracia e patrimonialismo), nossos políticos são parecidos. É a força das instituições, ensinava Montesquieu.
Outro ensinamento veio de Machiavel, para quem a legitimidade do governante não está no julgamento de suas intenções, mas nos resultados de seus atos. Nesse sentido, é lacônico que o chefe do Executivo catarinense ainda venha à público defender sua integridade moral. É claro que interesses nada republicanos estão corroendo seu poder, mas nem sequer o homem consegue explicar o caso dos respiradores, tampouco o reajuste salarial aos procuradores do Estado, patrimonialistas legalizados que o meteram numa fria.
Ante o motivo, seria irracional que opositores e derrotados perdessem uma chance dessas. O inexperiente governador caiu na ladainha de que o custo de uma “justa” equiparação salarial seria compensado pela proteção dos procuradores aos seus atos de economia e justiça. A história de rever contratos superfaturados e eliminar despesas desnecessárias de nada valerá. E, erradas ou não, as decisões típicas de um bombeiro bem-intencionado na pandemia resultaram no agravo de seus eleitores, cujo voto de confiança lhe foi outorgado por um incendiário.
Pode-se acusar os eleitores de ingenuidade ou irresponsabilidade? Não, porque a democracia autoriza loucuras coletivas. Do mesmo jeito que foi empossado, será destituído por políticos e empresários impacientes e sem interlocução, além de eleitores vingativos. Certos ou não, votaram no bombeiro para que seguisse as ordens do incendiário. Suas “boas intenções” valem tão pouco quanto as acusações de “rachid” na família do presidente da República, cuja popularidade só aumenta (segundo pesquisa do Ibope, 24/09/2020).
No sentido estrito, Moisés não é um político. Políticos são players, calculam o tempo todo e seu jogo é excitante. Agem com vistas aos fins últimos, disse Max Weber, um dos fundadores da Sociologia e da Ciência Política contemporânea. Poder é o fim último e o meio é o apoio do eleitor, a massa que jamais deve ser abandonada e que segue o líder. O deputado Jessé Lopes (PSL-SC!) bem expressa isso e a conveniência da frase cede as honras ao seu autor: “… trata-se de tirá-lo por ter traído o presidente e restabelecer a honra dos nossos eleitores”.
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