Será que perdemos o foco? – Maternidade

sabrina_100Coluna: MATERNIDADE

por SABRINA HOFFMANN
jornalista e mãe

Quando eu era criança e comecei a ir pra escola, lembro que uma das coisas que mais odiava era ter que pegar o ônibus sozinha. Na verdade, no mesmo ponto sempre tinha mais de cinco outras crianças – todas da vizinhança e super conhecidas. Mas o que eu queria mesmo era que a minha mãe fosse comigo, todo santo dia. Ela foi algumas vezes, até que decidiu que eu poderia muito bem andar uns 100 metros sem segurar na mão dela.

Se na época fiquei pê da vida, hoje vejo que esse tipo de atitude dos nosso pais foi fundamental para que eu e você pudéssemos criar independência e aprender a enfrentar os pequenos desafios diários. Só que hoje, com a minha filha, o jogo começa a virar. Quem disse que tenho coragem de largar a mão dela e dizer: “vai, pode fazer isso sozinha”?

criancas_playgroundTalvez sejam outros tempos, tudo está mais perigoso, é assalto por todo lado. Mas, pensando bem, não deve existir um ladrão no meu banheiro, escondido atrás do box, impedindo a criança de ficar cinco minutos sozinha por lá. E provavelmente ela não vai ser raptada se ficar assistindo desenho na sala enquanto termino o almoço. Mas, ainda assim, prefiro que ela fique sentada na mesinha ao lado, desenhando enquanto eu lavo a louça e vejo cada movimento dela através do reflexo da vidraça à minha frente.

Isso é só a ponta do iceberg. Já cansei de ver pais cobrando dos professores o porquê do filho estar de castigo, mesmo que tenha tentado estrangular o colega. Também já vi diversos deveres de casa tão bem feitos que parecem um trabalho de faculdade – o obviamente a criança sequer passou perto.

Basta uma voltinha no shopping ou no parque pra gente ver pilhas de pais se empoleirando nos playgrounds, evitando a qualquer custo um tombo ou arranhão. E aí é impossível não surgir a dúvida: até que ponto estamos apenas protegendo e quando passamos a podar nossos filhos, evitando que descubram o mundo por conta própria? Será que perdemos o foco e, ao invés de educar, estamos assumindo uma função de super protetores?

Eu daria tudo o que tenho para evitar qualquer fagulha de sofrimento da minha filha. Gostaria de fazer mais por ela para que não precisasse tomar o remédio ruim nem ficar de molho por causa da bronquite que volta e meia insiste em aparecer. E não quero nem pensar no marmanjo sem escrúpulos que vai magoar o coração dela quando a adolescência – Senhor, tenha piedade! – chegar. Poderia arrancar os olhos dele só de imaginar que poderá trair a confiança dela.

Há um tempo vi a notícia de pais indo reclamar e tirar satisfações com professores. NA FACULDADE. Como se os filhos, já na casa dos 18, não tivessem autonomia nem preparo para lidarem com este novo desafio.

Nós estamos preparando nossos filhos para o mundo? Ou apenas criando um casulo, que não poderemos sustentar por muito tempo?

Sinto muito, minha filha, mas o sofrimento faz parte da vida e não posso perder o foco em te educar. Não poderei te proteger de tantas coisas ruins que ainda vais ter que enfrentar. Porque este não é o meu papel. Mas quero e sei que apesar de errar, posso sim te preparar para esse mundão. Hoje, só gostaria de ter um pouco mais de coragem para olhar nos teus olhos e dizer: pode ir, encara a vida de frente! E se der medo, saiba que eu e teu pai estaremos por aqui, com os braços abertos, prontos para te acolher.

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