Quem são os artistas que atuam no humor em Santa Catarina e o que permeia a construção dessas personas é o que a pesquisa Preto Humor – Pesquisa de comicidade negra catarinense buscou responder e analisar durante o desenvolvimento do projeto, além de debater temas cruciais na sociedade e na arte em um Estado majoritariamente branco, que precisa desconstruir ideias racistas na comicidade.
Ser artista é complexo, muitas vezes difícil de definir, por isso, o projeto de pesquisa ressignificou o que é a comicidade e, dentro disso, compartilhou as descobertas com artistas, pesquisadores e a comunidade em geral que demonstrou interesse no tema.
Além disso, buscou-se entender a construção do humor catarinense como algo social e uma extensão dos artistas, pesquisadores e comunidade. A missão do projeto é destacada pelas artistas e pesquisadoras Natele Peter e Ruth Rodrigues.
“O projeto contribuiu não somente para nosso crescimento e conhecimento artístico, mas sobretudo nos permitiu conhecer mais nós mesmas, nossas histórias e ancestralidades. Percebemos ao longo da pesquisa que podemos desfrutar de novas investigações e dar novos ressignificados para assim irmos além de um território já percorrido, nos faz crescer e entender a potencia das nossas pluraridades enquanto corpos negros, pesquisadoras e viventes em Santa Catarina. Novos e possíveis caminhos estão abertos e sabemos por onde queremos caminhar, que artistas que buscamos ser e com certeza o projeto contribuiu para uma construção e busca de uma comicidade que todos possam rir sem ferir”, destaca Ruth Rodrigues.
Natele destaca que, apesar da pesquisa apontar um norte sobre os caminhos artísticos que devem trilhar de agora em diante, isso não muda a realidade na qual ela, Ruth e outros artistas pesquisadores vivem, mas que o trabalho reafirmou os valores que elas enxergam no humor.
“Não podemos romantizar que agora o ‘mundo virou’, o mundo é mundo desde sempre e algumas armadilhas ainda continuam enraizadas nesse território. Mas com certeza a pesquisa contribuiu tanto para nós quanto para as pessoas que foram atingidas, precisamos girar a chave e a pesquisa veio com toda e sua potência, afirmou e reafirmou, a comicidade que buscamos. Queremos fazer e construir a partir daqui, sabemos cada vez mais os lugares que queremos ocupar e que tipo de comicidade queremos fazer. Que este seja apenas o primeiro passo para o surgimento de um novos olhares de uma nova forma de fazer humor e comicidade”, explica Natele Peter.
O projeto é pleiteado pelo prêmio Elisabete Anderle 2020 Artes Populares- Culturas Negras e Afro Brasileiras e foi orientado e coordenado pela artista, pesquisadora e doutora em teatro Adriana Patrícia dos Santos, Drica Santos, que destaca os avanços da pesquisa para o humor catarinense
“Penso que o projeto foi fundamental para aguçar o movimento e enfoque numa perspectiva afrocentrada e antirracista de humor e riso no teatro e na palhaçaria. Neste sentido, sobretudo em Santa Catarina, aguçar este movimento e debate é fundamental, e o projeto se tornou uma provocação potente”, ressaltou Drica.
A pesquisadora completa destacando os avanços que o compartilhamento da pesquisa com artista, pesquisadores e comunidade interessada resultou na comunidade, “As ações de compartilhamento com a comunidade artística e em geral, das descobertas e caminho da pesquisa foram desestabilizadoras e provocadoras de uma reflexão sobre como o racismo opera em nossos corpos, cotidianos, escolhas, humor e riso no contexto catarinense. E o processo investigativo e poético proporcionado pelo projeto, me trouxe possibilidades de um aprofundamento pedagógico na busca por práticas e poéticas de riso, humor e cena, cada vez mais de(s)coloniais e afro referenciados”.
Para Drica, o avanço primordial do projeto foi na ruptura do racismo cultural, chamado também de racismo recreativo, o qual tem uma presença marcante em Santa Catarina. “Penso que uma das maiores potências alcançadas esteja no espaço de ruptura e de provocação a um racismo cultural e estrutural na cena catarinense, em específico, nas regiões onde atuamos. Pude observar quão ricas, polêmicas e impactantes foram as vivências compartilhadas; o quanto as pessoas que participaram sejam da oficina ou da web aula foram afetadas pelo material trabalhado na pesquisa”.
A pesquisadora completa: “quanto a mim, enquanto coordenadora do processo, digo que aprendi muito nesta jornada: com a oportunidade de experimentar como conduzir caminhos pedagógicos no trabalho de atrizes/palhaças negras, e com a responsabilidade em me colocar neste lugar enquanto função; além de aprender muito com Natele e Ruth no que construímos juntas, nos aquilombando, nos apoiando, e por meio da prática, vislumbrarmos afro pedagogias em nossos processos criativos artísticos”.
Mais sobre o projeto
O projeto Preto Humor – Pesquisa de comicidade negra catarinense foi criado com o objetivo de conhecer e trazer experimentos poéticos e cênicos para artistas que atuam no cenário cômico catarinense.
Orientado por Drica Santos, artista, pesquisadora e doutora em teatro, o projeto foi desenvolvido pelas atrizes-pesquisadoras Natale Peter e Ruth Rodrigues. A pesquisa Preto Humor é norteada pela tese de Drica Santos intitulada “Dos guetos que habito: Negritudes em procedimentos Poéticos Cênicos”, baseada em suas pesquisas acadêmicas sobre as implicações em ser uma atriz negra.
“Eu sempre levava isso como questão, então quando tive a oportunidade de pesquisa eu fui falar sobre isso, sobre teatro negro, atores e atrizes negras. Logo após já emendei na tese, e nela aprofundei pra falar do meu trabalho como atriz, como faço essa trajetória de reconhecimento, de aprofundamento sobre a compreensão e as implicações do meu corpo negro, como atriz na arte no teatro”, explica Drica.
O projeto de pesquisa nasceu então desta necessidade, e da inquietação de duas artistas negras blumenauenses que buscam se reconhecer em trabalhos artísticos desenvolvidos em Santa Catarina. “Importante nos reconhecer, saber por onde andamos e quem são os andantes. Apreciar os trabalhos de outros artistas negros nos ajuda a entender onde estamos e para onde também podemos ir, assim criando diálogo e fortalecimento entre a classe artística negra”, destacam as pesquisadoras.
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