A Lei Complementar n. 775, de 03 de novembro de 2021, que altera a lei que dispõe sobre o Sistema Estadual de Educação para permitir a educação domiciliar – o chamado homeschooling – no Estado foi declarada inconstitucional, como sustentado o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC). A decisão judicial pela inconstitucionalidade foi por unanimidade do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), em julgamento realizado na quarta-feira, 1º.
A ação foi ajuizada pelo Centro de Apoio Operacional do Controle da Constitucionalidade do MPSC (CECCON), agindo por delegação da Procuradoria-Geral de Justiça. Na ação, o Ministério Público sustentou a existência de inconstitucionalidade formal em razão da ofensa às regras de competência e iniciativa legislativas.
O CECCON defendeu que a Lei Complementar n. 775 interfere na competência privativa da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação, em afronta ao artigo 8º da Constituição Estadual e ao artigo 22, inciso XXIV, da Constituição da República e também usurpa a competência municipal para dispor sobre os sistemas municipais de ensino e seus respectivos órgãos, conferindo-lhes novas atribuições de cunho avaliativo e fiscalizatório.
Acrescentou o Ministério Público, ainda, que, ao disciplinar o tema por iniciativa legislativa parlamentar, a Lei estabelece novas atribuições aos órgãos da administração pública, violando a previsão dos artigos 32, caput, e 71, inciso IV, alínea “a”, da Constituição Estadual.
Em seu voto – seguido por todos os integrantes do Órgão Especial do TJSC – a relatora da ação, Desembargadora Maria do Rocio Luz Santa Ritta, fez menção à relevância da argumentação do Ministério Público, presente na medida em que o STF já firmou entendimento de que o homeschooling, apesar de compatível com a CF/88, não é garantia constitucional, nem consubstancia regra auto aplicável, dependendo de criação e regulamentação prévia e originária pelo Congresso Nacional, por meio de lei federal, cuidando-se de competência privativa da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional.
O CECCON destacou que a Lei nº 9.394/1996, Lei de Diretrizes e Bases de Educação Nacional (LDB) estruturou o ensino nacional a partir da premissa fundamental da presença do aluno em sala de aula, por isso que dispôs no seu artigo 6º ser “dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das crianças na educação básica a partir dos quatro anos de idade”. Assinalou também que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) repete essa norma ao inscrever em seu artigo 55 que os “pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino”.
“Instituir o direito à educação domiciliar no Estado de Santa Catarina é contradizer toda a legislação federal e a política pública adotada em âmbito nacional, ultrapassando os limites da suplementação que compete ao Estado, no âmbito das competências legislativas concorrentes”, considerou o MPSC na ação.
Dessa forma, sustentou que o ensino domiciliar não se contém na atual estrutura da educação nacional, pois toda a sua base está erigida em torno da presença do estudante em sala de aula, com esforço legislativo contra a evasão escolar.
“Obrigatoriedade de matrícula, frequência, conteúdo programático, rede de ensino, órgãos de controle e fiscalização, métodos de avaliação, socialização dos alunos, absolutamente tudo foi construído a partir da premissa fundamental do comparecimento obrigatório do estudante no recinto da escola. Esse é o modelo da educação nacional até então vigente”, sintetizou a Desembargadora em seu voto.
A decisão é passível de recurso. (Ação n. 5061030-73.2021.8.24.0000).
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