Opinião | Monocultura eleitoral: a não escolha de um lado e a disputa mais importante

Imagem gerada com IA

O domingo foi o dia em que em muitos cantos do Brasil os eleitores votaram novamente, escolhendo em segundo turno os governantes de suas cidades. Eu, como qualquer cidadão consciente, fiquei aqui, observando cada resultado, cruzando os dedos, apostando minhas fichas emocionais. Não porque me preocupo apenas com quem vai dirigir a máquina pública, mas por, honestamente, meu coração também pulsar por outra disputa: Blumenau, que encerrou a eleição municipal no primeiro turno, precisava decidir quem reinará absoluta… na Oktoberfest 2025. Essa sim, convenhamos, uma escolha relevante. E eu, que não tenho direito ao voto dessa vez, confesso depositei minha torcida pela Gabriela Schoeler. Entre uma cédula e um caneco de chope, minha preferência não tem margem de erro e está defina.

Dizem que na política, como na cerveja, o que importa é o teor do conteúdo. Por sorte a nossa, ao menos na quantidade de sabores do líquido é incomparavelmente maior que o cardápio ideológico apresentado ao cidadão catarinense que, a propósito, já repartiu o trono real das prefeituras lá no início do mês.

Convenhamos que a paisagem eleitoral do nosso Estado lembra um pouco a uma prática da agricultura: uma vastidão quase homogênea onde só brota uma variedade de sementes — a da direita. No meio deste campo monocromático, a esquerda vai ressurgindo lentamente, ainda incapaz de plantar uma novidade que vingue, enquanto o centro político… bom, esse talvez tenha encomendado seu epitáfio, parece até ser o solo mais infértil da paisagem, sumido, envergonhado.

E o eleitor catarinense? Continua por ai, com sua insatisfação silenciosa. Os números de abstenções e votos nulos falam mais alto que qualquer slogan de campanha, ultrapassando 25% do eleitorado em média, e chegando perto dos 40% em certas localidades. Muitos dos que compareceram às urnas, também, escolheram o “menos pior”, empurrados pela sensação de que a democracia deve ser exercida, mas já sem a esperança de que um nome pudesse, de fato, representar suas demandas.

O que assistimos, depois que as urnas revelaram os vencedores, é a comemoração em um dia e o planejamento, iniciado ainda na ressaca, de como será a próxima festa das urnas. O PSD demonstrou uma força gigantesca, agora ostenta o título de maior partido em número de prefeituras no Brasil. Esta coroa também está no PL, como o que mais prefeitos (as) elegeu em Santa Catarina. E o MDB, dançando a marreca, seria uma terceira princesa catarinense desta dança eleitoral, que já não demonstra mais o mesmo brilho, nem inspira a confiança, mas tenta manter-se relevante (apenas).

Lá no “X” (ex-Twitter), em 11 de junho, arrisquei uma previsão de como seria o resultado eleitoral em Santa Catarina. Relendo meu palpite vejo que não passei tão longe. Previ que o governador Jorginho Mello (PL) fabricaria uma safra de prefeitos digna de um desfile, destes que lota a rua XV de Novembro, todos marchando no compasso do “Zigge Zagge” das vontades governistas. Pois bem, ele conseguiu, como um mestre cervejeiro que acertou a receita.

Nesta fermentação política, o PL mistura na sua formula de gestão os adesistas do MDB, PSD, PP, União, Novo, PSDB, Cidadania e qualquer outra sigla que não pertença ao campo progressista. É possível que em 2026 estejam todos juntos, inviabilizando qualquer construção adversária. Dentro dos partidos aliados de Jorginho, o culto ao 22 de Bolsonaro está a cima de qualquer coisa. Entre as ideologias ou a chama do bolsonarismo, muitos jogariam a cartilha partidária no lixo sem titubear. E aí está o problema.

Meu palpite é que o governador, na busca pela reeleição, deve ter ao seu lado com o PP, na vaga de vice-governador, com Novo e PSD ao senado e um punhado de partidos grudados. E o MDB, você deve pensar? Bom, azedou mais que chucrute estragado. É que nesta festa o eleitor retirou o partido do camarote. Hoje, o que resta é uma tentativa desajeitada de apoiar o governo em troca de alguns cargos. Me parece pouco para um partido de pedigree e história como a que construiu.

Aliás, esse MDB já foi dono da festa. O antigo “campeão de votos” catarinense encontra-se em meio a uma crise de identidade. A trajetória do partido em Santa Catarina sempre foi marcada por figuras que transformaram o Estado. Muito antes do tema ganhar a boca do povo, o Governador Paulo Afonso já trabalhava o municipalismo da gestão; Luiz Henrique e Eduardo Moreira implantaram a descentralização e fizeram da máquina pública uma espécie de mutirão para acolher o cidadão em cada rincão. E tantos outros trouxeram inovações para o dia-a-dia da administração, como um jardim cheio de variedades. Hoje, porém, o sentimento é que esse jardim secou.

Depois que Luiz Henrique partiu, o MDB foi perdendo o rumo, parecendo aquele sujeito que perde o equilíbrio depois da quinta caneca de chope. Em Blumenau, por exemplo, a cidade que um dia foi símbolo da força emedebista, teve sua segunda eleição municipal consecutiva sem eleger sequer um vereador.

É como tentar vender cerveja quente em plena Oktoberfest – simplesmente não funciona. Por isso, parece que um alinhamento automático ao governo Jorginho em troca de alguns cargos é a certeza de virar água com gás dentro do caneco de 2026. Esse enfraquecimento gradual, lembra a monocultura em sua fase final: quando o solo está exaurido, estéril, e nada mais brota com o mesmo vigor. É possível que o partido encolha, no próximo pleito, as bancadas no Senado, na Câmara e na Assembleia Legislativa, especialmente de representantes do Vale e Norte do Estado.

Enquanto os novos prefeitos e vereadores se preparam para um novo ciclo, e a Oktoberfest ganha sua nova realeza, Blumenau e Santa Catarina enfrentam o desafio de sua própria monocultura eleitoral. Parece bastante evidente que existe uma enorme possibilidade de brotar um caminho corrente, ao centro, que resista a essa condução de mão única da política pública catarinense, a direita. Uma alternativa que seja mais do que um símbolo, mas uma proposta que faça os eleitores, novamente, querer apertar um número na urna com convicção. Até lá, sigo torcendo – pela Gabriela, para nossa Rainha Oktober, e que nossos políticos saíam do reino da mesmice.

Tarciso Souza, jornalista e empresário

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