Opinião | O fato às favas: o importante é o pertencimento e o voto!

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“Quanto mais longe você conseguir olhar para trás, mais longe você verá para frente”. Mergulhando na história é possível conferir que, desde sempre, o homem busca maneiras de ser aceito no meio que está inserido, camuflando fraquezas, expondo forças. Em uma época, os gestos e ideias fora de lugar ajudavam a garantir a sobrevivência. Outros momentos, porém, negar a realidade é como o estender dos abraços em direção ao bando, pedindo aceitação. Hoje, as antigas praças e salões cedem lugar à vastidão virtual das redes sociais, para homens e mulheres exercitarem a necessidade intrínseca de pertencer em uma teia complexa de interações.

Acompanhar os desdobramentos da vida, da política, nos dias que seguem, sem o desejo de estar em algum grupo, é como assistir um filme destes com misturam várias linhas temporais, transcendendo o próprio tecido factual da realidade. Sabe um rio que teimosamente muda de curso, ignorando os leitos traçados pelos fatos inegáveis? Acho que você entendeu…

O Brasil de nossos dias está um emaranhado só. Até poucos anos dava para arriscar que o cheiro de política era de praça pública, com aroma de café. Não apenas por influência do cultivo do grão. Principalmente por encontrar nestes locais, em cada esquina, um ambiente vasto para sociedade debater os seus rumos. Agora, as vozes das multidões encontram abrigo nas plataformas digitais. Um palco turbulento, barulhento, pensado para viciar. E, justamente, é nessa arena que o pertencimento e a verdade factual embarcam estão em lados opostos.

No atual cenário, o exemplo dos “escândalos das joias” se desenha vívido. Envolto em sombras e questionamentos, o político encontra nas entranhas das redes sociais um lugar onde as fileiras de seus apoiadores se reúnem. Um exército virtual que, em nome do pertencimento, ergue escudos de incredulidade diante das evidências que clamam por justiça. O pertencer ao grupo, o defender com unhas e dentes, se sobrepõe à própria solidez dos fatos.

Em tempos pandêmicos, também, a vida em rede deixou uma contribuição negativa para esta discussão. Muitos foram os gestores públicos que desafiavam a ciência médica com a força de um titã, travestindo seus interesses em roupagem de verdades alternativas. Sob o clamor dos apoiadores, debates furiosos nas redes enfrentavam as evidências, cedendo terreno, no mundo real, à teimosia negacionista que conduzia para morte tantos brasileiros.

Tudo em nome do pertencimento, do voto!

Em meio aos discursos retorcidos, à névoa de desinformação. Dos corredores da política contemporânea – do parlamento e do executivo – emergem figuras que habilidosamente deturpam, se dedica as inverdades na rede. Por não ter a capacidade de apresentar respostas, propostas para comunidade, escolhem atacar os mais fracos: mentem ou fabricam versões, jogam no campo do medo, demonizando os temas mais sensíveis para população, como drogas, sexo e segurança. Em nome do voto, usam o poder, a retórica distorcida, a fé e o que mais precisar para explorar as ansiedades coletivas, aplicando estereótipos simplistas, criando inimigos imaginários.

As notícias falsas, como armas digitais afiadas, deixam um rastro triste de fim… de esperança, de amizades, de vidas. Os pobres e os marginalizados, antes silenciados nas esquinas, agora encontram suas vozes caladas novamente, desta vez pelo coro de desinformação digital. Basta um “socó” qualquer, empoderado por um cargo eletivo, atacar um marginalizado para a exclusão social ser aprofundada.

O que importa a verdade? O que importam os fatos? Se as mentiras encontram solo fértil nas almas daqueles que clamam por uma missão, um sentimento de utilidade, ainda que a importância, a realidade, seja uma narrativa conveniente para acalmar o ego falido. As conexões virtuais muitas vezes extrapolam os limites do discernimento. Os fatos são dobrados, retorcidos, justificados e ignorados em nome de uma adesão a uma tribo digital. Este é novo tempo! A verdade cede terreno à subjetividade, e o pertencimento torna-se o farol a guiar por um labirinto tenebroso.

A frase do velho primeiro ministro britânico, Winston Churchill, que abre este texto, ajuda recordar que antes de nós o planeta já recebeu outras tantas cabeças. Todas, sem exceção, construíram interações, viveram experiências de assistir a história – sua própria história – ser escrita. E o tempo, desde sempre, ensina que independente de nossas convicções e pensamentos, os fatos são incontestáveis. Não cabe a nós escolher como as coisas acontecem. Porém, em nossas mãos, está o poder de definir como seremos lembrados daqui a muitos e muitos anos. Como um aceno do passado para o presente, é fundamental lembrar de equilibrar a ânsia pelo grupo com a valorização da verdade objetiva. Pois, no final das contas, a teia virtual pode ser traiçoeira, nos conduzindo pelo caminho do pertencimento cego, enquanto a realidade posta clama por nossa atenção.

Tarciso Souza, jornalista e empresário

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