Opinião | Os dois lados da moeda do conceito ESG – Ambiental, Social e Governança

O padrão de vida e o consumo de energia estão fortemente entrelaçados, pois, sem energia, não existem produção de alimentos, mobilidade, aquecimento, processos industriais, serviços bancários, em outras palavras, a sociedade perderia as benesses e o conforto proporcionados pelo modelo capitalista de produção de bens e serviços.

Portanto, não é de surpreender que os países tenham colocado a produção de energia como elemento-chave em suas políticas nacionais. Nesse panorama, a bola da vez é a produção de energias renováveis.

Ocorre que, nesse mesmo campo de jogo, há cerca de uma década surgiram três letras representadas por ESG (Environmental, Social and Governance, ou, Ambiental, Social e Governança em português) as quais servem de diretrizes para empresas atuarem de forma sustentável.

Existe uma simbiose entre o acrônimo ESG e os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas. Esse conjunto de objetivos, segundo a ONU, conduziria a humanidade ao fim da pobreza, à proteção do planeta e a garantia de que até 2030 todas as pessoas desfrutariam de paz e prosperidade. Dessa forma, à medida que o mundo dos negócios buscasse adotar intensamente procedimentos ESG, mais próximo a humanidade estaria de conquistar os ODS.

O lado bom do ESG é que estimula (mesmo que a contragosto) empresas a criarem negócios sustentáveis e, também, a incorporação de práticas ESG em suas atividades pode de fato auxiliá-las a reduzir custos e riscos, incrementar fluxos de receita e ainda promover mudanças sociais positivas.

Já, o lado negativo desse cenário é que esse boom do investimento em ESG perpetua o devaneio de que o mundo corporativo irá despejar trilhões de dólares a toque de caixa para financiar essa mudança de paradigma rumo a uma economia de baixo carbono. Essa esperança causada por essas três letrinhas mágicas é um equívoco e muito provavelmente relaxará as atitudes para se viabilizarem as diversas parcerias público-privadas necessárias, para que de fato o mundo possa redesenhar práticas sustentáveis que resultem em um aumento do bem-estar ambiental e social.

No contexto atual, o que se vê é uma crise energética ocorrendo principalmente na Europa, devido principalmente à adoção acelerada de práticas ESG que promoveu drásticos cortes na produção de carvão. A Europa é altamente dependente da Rússia para suas necessidades energéticas, e o advento da guerra na Ucrânia fez com que a União Europeia aplicasse sanções à Rússia proibindo a importação de petróleo e também reduzindo as compras de gás natural russo.

Em vista disso, o continente europeu está reativando as usinas a carvão e voltando a emitir gases de efeito estufa dessa produção, no curto prazo. Mas, em decorrência desse imbróglio, olhando-se a longo prazo, as metas climáticas do continente para fazer a transição para as energias renováveis, estão se acelerando mais do que o planejado originalmente.

Construções de novas capacidades solar e eólica são complexas e levam tempo, além do que, mesmo que estivessem prontas, a maioria dos lares europeus não está equipada para obter o calor dessas fontes, mas, sim, do gás natural que se tornou escasso no continente.

O paradoxo é que não há escassez de recursos fósseis no planeta (que continuam abundantes) para justificar essa transição frenética para as fontes de energia renováveis.  Isso está trazendo insegurança energética para os países desenvolvidos e, também, favorecendo a um aumento da pobreza energética nos países periféricos.

Na realidade, o combate à pobreza energética só é possível mediante o abrangente acesso à energia confiável e de baixo custo, cujas fontes vêm de combustíveis fósseis, energia hidrelétrica, ou ainda, energia nuclear. Dados da Agência Internacional de Energia (IEA) mostram que próximo de 3 bilhões de pessoas ainda usam menos eletricidade do que uma geladeira americana típica. Algo como 2,6 bilhões de pessoas ainda usam madeira ou esterco para aquecer e cozinhar.

No entanto, a imposição de políticas ESG vêm restringindo investimentos de empresas em países que não apresentem um compromisso com energias renováveis. E as consequências estão chegando. Entre 2011 e 2021, segundo o Financial Times, os investimentos em exploração de petróleo e gás diminuíram 50%, ou seja, menos investimento significa menos oferta que leva a preços mais altos. Além disso, some-se as pressões e boicotes de gestores-ativistas climáticos de fundos sobre as gigantes de energia do setor privado, com propósito de suspender investimentos em petróleo e gás em favor de energias renováveis e outras tecnologias verdes.

Efetivamente, essa série de ações em prol de ESG têm ainda impedido financiamentos de projetos de combustíveis fósseis em regiões mais pobres, a exemplo do HSBC que foi duramente criticado por financiar, em 2018, seis novas usinas de carvão na Indonésia e no Vietnã. Na oportunidade o HSBC justificou corretamente sua posição dizendo que se deve equilibrar adequadamente as necessidades humanitárias locais com a necessidade de transição para uma economia de baixo carbono.

A Índia possui cerca de 300 milhões de pessoas vivendo em um dos mais pobres padrões de vida. Em abril de 2021 o pesquisador de energia indiano Vijay Jayaraj escreveu uma carta aberta a John Kerry, Enviado Especial dos Estados Unidos para Questões Climáticas. Um dos trechos diz “Você está pedindo às famílias pobres indianas que abandonem o petróleo e o gás, mas você não abraça o evangelho do clima que está pregando. Não é certo, o meu povo voltar para uma era de apagões de energia, e você poder voar em seu jato particular bebedor de petróleo para a Islândia para receber um prêmio. Devo informá-lo que, a única opção para a Índia lutar contra a pobreza energética é usar combustíveis fósseis confiáveis e acessíveis, e não os caros e não- confiáveis como eólicos e solares. […] as energias renováveis aumentaram o preço da eletricidade em todas as redes nas quais foram introduzidas.”

Dessa forma, o movimento ESG mostra seu lado perverso ao privar milhões de pessoas do acesso à energia suficiente e de baixo custo, visto que a indústria energética é a base de todas as outras indústrias. Ao tornar a energia mais cara, o ESG provoca efeito cascata nas cadeias produtivas de outros setores da economia, prejudicando e condenando a pobreza de forma direta e contínua, pessoas e famílias mais desfavorecidas economicamente.

Em suma, talvez seja o momento de se priorizar a letra S antes do E!

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