Opinião | Quanto vale uma árvore?

Foto: reprodução

Quando cortamos árvores criamos uma condição de duplo prejuízo ao controle climático. A decomposição ou a queima da madeira produzirá gases de efeito estufa (GEE) e a árvore cortada também não irá mais capturar carbono atmosférico. Mas ainda não acordamos para o fato de que a manutenção das florestas e o reflorestamento com espécies nativas poderão contribuir para eliminar cerca de um terço do problema do aquecimento global, sem falar nos aspectos paisagísticos e ecológicos. Seguimos na contramão da proteção e recomposição florestal. Em muitos países isso já foi percebido e transformado em política pública, mas não aqui. A Coréia do Sul é considerada a nação que mais avançou nesse sentido. Nas últimas três décadas foram plantadas cerca de 7 bilhões de árvores, o que contribui para estabilidade dos terrenos, controle climático, maior fornecimento natural de água, preservação da biodiversidade, recomposição cênica, purificação do ar, entre outros benefícios, num país apenas um pouco maior que Santa Catarina e cuja área plantada por espécies nativas corresponde a quase metade do seu território.  No Brasil, vale lembrar que os nossos dois principais biomas florestais, a Amazônia e a Floresta Atlântica já estão devastados em cerca de 35% e 90% respectivamente. Paralelamente, em vez de ampliarmos as áreas protegidas, em diferentes formas (unidades de conservação, áreas de preservação permanente, reservas legais etc), mudamos leis e decretos para diminuir a proteção e pouco avançamos na arborização urbana.

A falta de árvores é um problema comum também às cidades brasileiras. Porém, no desenvolvimento urbano, além de serem coadjuvantes (quando muito) no planejamento, seguidamente são tidas como problema, gerando conflitos no espaço público e privado. As árvores precisam de solo e água, dois componentes normalmente escassos nas áreas mais centrais das cidades. Moradores e pedestres consideram as folhas, galhos e frutas que caem das árvores, um incômodo. Elas rivalizam com a fiação elétrica e até “atrapalham” as câmeras de vigilância, à medida que crescem. Paradoxalmente, todos querem árvores, mas no terreno dos outros. Devido ao conflito, nos esquecemos das vantagens que as árvores trazem no ambiente urbano: embelezam a paisagem, produzem aromas agradáveis, retiram o excesso de poluentes atmosféricos, servem de abrigo e alimento para pássaros, fazem sombra, diminuem o calor e aumentam a percolação de água no solo. Por tudo isso, cidades agradáveis (e modernas) precisam ter árvores nas casas, nas calçadas, nos jardins, nas escolas e nos pátios das empresas. Em muitos países isso é consenso e o planejamento de empreendimentos públicos e privados contempla as árvores como elementos fundamentais. Mas é preciso planejar sobre o plantio, escolhendo a espécie e o local adequados, para evitar que os tomadores de decisão acreditem que o melhor para o desenvolvimento urbano seja sempre sacrificar as árvores, quando houver conflitos futuros.

Sabemos que as árvores são importantes nas cidades por razões ambientais e ecológicas, mas você já parou para pensar nesses serviços e outros que uma árvore presta no ambiente urbano e em quanto isso poderia representar do ponto de vista econômico? Pois bem, a cidade de Nova York fez isso. Levantou quase 700 mil árvores e chegou a números muito impressionantes. O estudo, que considerou uma grande quantidade de informações existentes e outras observadas por voluntários e pesquisadores, revelou que essas árvores são capazes de reter quase 4 bilhões de litros de água de chuva, poupando cerca de 11 milhões de dólares por ano em reparação de danos fluviais e inundações; reduzem as emissões de gases poluentes em cerca de 1,2 milhão de toneladas, gerando economia de outros 11 milhões de dólares e; diminuem o consumo energético na ordem de 85 milhões de dólares. Assim, cada árvore novaiorquina vale, em média e por ano, algo próximo de 170 dólares, o equivalente a uns 850 reais. Isso parece pouco? Deveríamos pensar nisso antes de cortar uma árvore? É claro, que o aspecto econômico é muito importante, mas obviamente deveríamos dar mais atenção aos aspectos ambientais e ecológicos.

A cidade de Nova York criou um mapa para disponibilizar dados de todas as suas árvores em tempo real. O Mapa de Árvores Urbanas oferece dados e a localização de toda a flora urbana do município, sem contar a vegetação de parques e praças. A ferramenta permite que a comunidade ajude a cuidar da flora local de uma forma organizada, com orientação para tal. O código do programa é aberto, para que qualquer cidade, em qualquer parte do mundo, possa criar o seu a partir das informações existentes.

Cleverson Andrioli, doutor em Meio Ambiente e Desenvolvimento, professor do Instituto Superior de Administração e Economia (Isae), ligado à Fundação Getúlio Vargas (FGV), acrescenta que para este caso, o mapa é ótimo para envolver a população e inibir cortes ilegais. Segundo ele, sob o ponto de vista técnico, o foco da preservação não deve ser nas árvores de rua, mas nos bosques e parques. “Ali você tem todos os subsistemas, o conjunto que estabelece a biodiversidade e permite que a fauna se estabeleça”, continua. Mas uma espécie bem escolhida, plantada  em ruas, jardins, empresas e escolas,  pode cumprir um papel importante na polinização, o que também ajuda na preservação do meio ambiente e na saúde humana.  Não é para menos que a Organização Mundial para a Saúde (OMS) tem uma recomendação mínima de uma árvore por habitante nas cidades. Porém, mesmo Nova York ainda está longe desse índice.

Falando de Blumenau, a cidade abrigou recentemente o III Fórum Catarinense de Arborização Urbana, que trouxe dados e informações importantíssimas sobre os cuidados com as árvores das cidades, como o que plantar, quando e sua manutenção. Ao final dos debates, ficou ainda mais claro para mim que podemos pensar 10 vezes antes de plantar uma árvore, mas pensar 1.000 vezes antes de cortar uma.

José Sommer, professor, biólogo e educador ambiental.


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