Nos artigos anteriores sobre Educação, tratamos 1) da saúde dos professores e 2) da formação para o capital humano e social. São temas elementares a uma Educação voltada ao desenvolvimento local-regional e nacional. Sem essas duas prioridades, não há governo que resolva o problema, que é muito sério: vislumbrar um futuro viável aos nossos jovens. No terceiro artigo da série, apresentamos a defesa de uma Educação para o desenvolvimento local-regional, conectado com o global, com respaldo da BNCC. Essa ficha tem que cair!
O desenvolvimento regional é um tema intenso, bastante discutido no universo da política. Sua relevância na Educação é tema de artigo de Bazzanella e Godoi. Organismos de âmbito internacional como a OCDE e a Unesco também advogam por sua inserção na educação básica e superior, como mostra a análise dos autores Gumbowski, Jurazek, Noernberg e Maia, da região do Planalto norte.
O desenvolvimento regional se tornou um tema emergente nos anos noventa. A razão disso foi a crise econômica sentida em todas as nações, afetando locais, regiões e territórios por causa da globalização. A derrubada de barreiras alfandegárias e do protecionismo interno fragilizou economias locais-regionais. Por extensão, vale lembrar dos ajustes fiscais em países como o Brasil, restringindo a capacidade de endividamento de estados e municípios.
Foi necessário fazê-lo. Governos ficaram sem grana pra atender demandas de municípios e microrregiões. Bancos e empresas estatais foram vendidas e o tradicional ativismo estatal desenvolvimentista sofreu uma angustiante trégua. Isso forçou governos a respeitarem a matemática e as finanças públicas. Pra além disso, forçou os governos a se aproximarem da Sociedade e motivou o diálogo e a cooperação entre atores e municípios, fomentando o capital social.
Cursos de pós-graduação stricto sensu (mestrados e doutorados) surgiram em resposta aos desafios, às perguntas e às necessidades de compreender o problema e vislumbrar alternativas. Foi um movimento importante do ponto de vista criativo, dialógico e cooperativo. Mudou a visão tradicional, autoritária e centralizadora da política, e forçou sinergias entre Estado-Sociedade, aproximando governos, Sociedade ativa e universidades. É Schumpeter: a crise desperta a destruição criativa e aí, onde há inteligência e vontade, vem inovação.
Exemplo foi a descentralização político-administrativa em Santa Catarina (2003-2015), promovida pelo governo de Luiz Henrique da Silveira – MDB, precedida, inclusive, pelos Fóruns de Desenvolvimento Regional Integrado (1996-2002), apoiada pelo governo de Esperidião Amin – PP. Processos similares ocorreram em vários estados brasileiros, seguindo exemplos internacionais e Santa Catarina foi referência nacional.
Aqui, a descentralização despertou sentimentos de pertencimento, descentralizou o poder político para os territórios; desconcentrou recursos e estimulou o diálogo municipal e intermunicipal. O tema do desenvolvimento regional tornou-se um chavão, e conceitos como capital humano e capital social, entre outros como cooperação, diálogo, associação, solidariedade, confiança e civismo se disseminaram, na política, na economia e no meio universitário.
Curiosamente, no entanto, na Educação básica o tema meio que passou batido. É claro que esse movimento intelectual e político penetrou o ambiente escolar de algum modo. Afinal, vários professores e alunos de graduação e pós graduação eram docentes no ensino médio e levaram as preocupações com o desenvolvimento pra sala de aula com criatividade e autonomia. Mas, se olharmos os conteúdos curriculares formais, não se fala nisso!
Explicar o porquê seria importante, mas se estenderia muito aqui. Mais importante é defender nossa proposição: incluir o tema do desenvolvimento nos currículos escolares do ensino básico, ainda no ensino fundamental. Se fosse secretário de Educação do meu estado, me empenharia em potenciar o sistema educacional através da disseminação de conceitos, teorias, valores, ideias e casos sobre o desenvolvimento regional, a começar por capital humano e capital social.
Não obstante às dificuldades de toda empreitada inovadora, isso é viável, desde que um secretário da Educação esteja consciente. Daí em diante, tem o poder de todo governo eleito, tem a lei, importantes apoios e interesses legítimos, estrutura e apoio da Sociedade. Nessa perspectiva de poder e sinergia, integraria secretarias de Educação e de Desenvolvimento, entre outras. Então, chamaria professores e recorreria às nossas universidades regionais comunitárias.
As universidades são pérolas de cooperação e sinergia, cheias de interesses legítimos, além de mestrados e doutorados em desenvolvimento. Nem me restringiria às comunitárias; chamaria a todas, com seu capital humano e interesses. Aproveitaria o momento em que ao governo estadual interessa ajudar alunos com bolsas de estudo e canalizaria o escopo temático para projetos de pesquisa e extensão em desenvolvimento local-regional. Grandes resultados virão daí.
As possibilidades de sinergia são gigantescas e o resultado, material e imaterial, seria a intensificação do desenvolvimento sustentável e de uma cultura do desenvolvimento potenciada pela Educação. Nossos currículos escolares e universitários precisam de uma virada histórica, focada numa Educação situada no século XXI, orientada pela ideia-força do desenvolvimento regional e conectada com o global.
E os conteúdos das Humanidades precisam superar a exclusiva abordagem da conflagração social, como se este mundo fosse tão injusto quanto impossível de se viver. Santa Catarina, a propósito, é exemplo de que o combate às desigualdades resulta, primeiramente, do capital humano e social – vide dados do IBGE, desta semana, demonstrando nosso crescimento demográfico, sobretudo pela imigração, atraída por oportunidades, num Brasil vergonhosamente desigual, de baixa produtividade e má educação.
Lembremo-nos: “o conflito não é entre o bem e o mal, mas entre o conhecimento e a ignorância” (Buda).
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