O debate sobre mudança climática, aquecimento do planeta e sustentabilidade ambiental deixou de ser uma questão técnica para invadir o cotidiano das famílias em todo o mundo. Segundo as Nações Unidas, na década de 2010-2019, considerada a mais quente da história, anualmente mais de 23 milhões de pessoas foram obrigadas a se deslocar em face de eventos relacionados ao clima, provocando uma legião de seres humanos vulneráveis à pobreza. Levando esses dados em conta, cerca de 13 milhões de pessoas perdem a vida a cada ano por fatores ambientais, sem citar as consequências para a saúde derivadas da fome, desnutrição e ausência de acesso à água potável.
Recentemente, no Rio Grande do Sul, um ciclone extratropical, com ventos e chuvas torrenciais, ampliou o nível do rio Taquari, em Roca Sales, em pelo menos 22 metros, provocando a destruição completa da infraestrutura da cidade, do abastecimento de água, energia, comunicações e a perda de pelo menos 46 pessoas e com vários desaparecidos em toda a região.
São crianças, idosos, famílias inteiras que foram arrastadas pela violência e intensidade das águas. É uma tragédia humana que é muito superior à perda, já difícil, do patrimônio de uma vida toda: uma casa, um automóvel, documentos ou um jardim cuidado por décadas. São vidas que são perdidas de forma traumática, brutal, provocando a ausência definitiva e uma dor insuperável para familiares e toda a sociedade.
Agora estamos convivendo, em Santa Catarina, com mais um período intenso de chuvas. O transbordamento que afetou mais de 130 cidades, com destaque para o Alto Vale do Itajaí, mostra o tamanho da tragédia. O Rio Itajaí-Açú atingiu a marca histórica de 12,11 metros acima do nível. A interrupção de rodovias, perda de vidas, prejuízos econômicos, da infraestrutura e o desabrigo de famílias é enorme.
A cidade de Blumenau, que convive historicamente com a tragédia de enchentes, já contabiliza 97 cheias que deixaram milhares de pessoas desalojadas de suas casas e outras tantas perderam a vida nestes acontecimentos.
Já em outra área do país, a região Norte passa por uma seca devastadora. O Brasil declarou na última semana que o Rio Madeira, o mais longo e importante afluente do Rio Amazonas, está em situação crítica devido à estiagem que atinge algumas regiões da maior floresta tropical do planeta. Num período não muito distante, lembramos com tristeza os incêndios que afetaram brutalmente o Pantanal, deixando um rastro de destruição e nossa fauna e flora em cinzas por semanas.
Para cada episódio são novas ameaças à vida. Enfrentando a dor e com a solidariedade para resistir, aprendemos ensinamentos decisivos sobre a importância da prevenção, sobre o planejamento das áreas de risco, o monitoramento e o sistema de alertas de eventos climáticos, obras estruturais e ações ordinárias de limpeza urbana e drenagem, planos de contingência para a mobilização, assistência social e a valorização estratégica de defesa civil, como ação organizada para mitigar danos e recomeçar.
Esses ensinamentos já nos trouxeram avanços. Hoje, o estado de Santa Catarina é dotado de equipes profissionalizadas, sistemas informatizados, planos e estratégias de enfrentamento às catástrofes, além de uma população resiliente, com consciência, que participa e colabora para soluções coletivas de enfrentamento aos efeitos climáticos. Os bombeiros catarinenses adquiram expertise para o apoio especializado e já estiveram nas queimadas do Pantanal, da Amazônia, nos deslizamentos de Petrópolis (RJ), em Brumadinho (MG) e agora estão prestando inestimável apoio para a nossa população novamente.
O exemplo do povo catarinense pode e deve ser multiplicado. Todos nós precisamos ter consciência de que o desequilíbrio ambiental é uma ameaça grave da existência humana. O que não pode se repetir é a truculência e o arbítrio contra populações indígenas, com descumprimento de acordos, invasão de territórios demarcados e uso da força policial para impor decisões que poderiam tranquilamente ser tomadas com entendimento e negociação.
O conhecimento científico e a tecnologia já garantem a leitura antecipada dos eventos climáticos e os devidos alertas para a prevenção. O poder público deve se apropriar cada vez mais dessas ferramentas, além de planejar e garantir investimentos estruturais em drenagem, contenção de encostas, sistemas de comunicação integrada e manutenção constante de barragens. Em contrapartida, a sociedade também deve refletir sobre o seu comportamento e rever atitudes que podem alterar os paradigmas de consumo e de emissão de poluentes com efeito estufa. Caso contrário, dificilmente mudaremos a rota do desastre anunciado do desequilíbrio ambiental.
Tanto quanto na tragédia das secas e queimadas como nas cheias, a sociedade tem demonstrado a força da união e da solidariedade, mobilizando esforços voluntários e garantindo a reconstrução. Na mesma linha, o Governo Federal, Estadual, Prefeituras, forças armadas, bombeiros e a sociedade civil, planejam coletivamente a ação e protegem a população que precisa de apoio.
A vida volta a ensinar que juntos somamos forças e que sempre podemos progredir. É possível uma vida melhor, com responsabilidade para prever riscos e iniciativas para garantir mais sustentabilidade ambiental.
Ana Paula Lima, deputada federal (PT/SC) e vice-líder do governo na Câmara dos Deputados