Opinião | Todo carnaval tem seu fim

Foto: reprodução

Mal acabou o Natal e muito barrigudo, que ganhou uns trocados como Papai Noel, aproveitou janeiro para fazer a barba e se preparar porque fevereiro é mês de ser Rei Momo. Uns vestem a fantasia para ganhar o ingresso do baile, mas há quem fature com a brincadeira. A prefeitura do Rio de Janeiro, por exemplo, promoveu um concurso para eleger o melhor, que provavelmente sob os gritos de “ei, você aí, me dá um dinheiro aí”, faturou R$35 mil! E assim chegou o carnaval, mas antes mesmo que alguém fizesse o primeiro trocadilho do ano sobre a Mangueira, a escola de samba, quem podia, viajou. Para esses privilegiados, incluindo os nobres parlamentares do Congresso e do Senado, foi como naquele antigo samba-enredo: “liberdade, liberdade, abre as asas sobre nós”. 

Nem parece que, recém chegados do recesso de fim de ano, entre 23 de dezembro e 31 de janeiro, já entraram na folga de carnaval. Para a surpresa de quem “estava só o pó” e mesmo assim encarou o trabalho na “Quarta-feira de Cinzas”, os nobres parlamentares só voltam a ter compromissos na próxima terça, dia 28 de fevereiro. É aí que o brasileiro fica sabendo dessas coisas e pensa: “mamãe, eu quero”!

Enfim, eles voltam depois e, mesmo assim, apenas com discursos e homenagens. Coisa séria mesmo, como a votação de leis, a discussão do novo marco fiscal ou a Reforma Tributária, só no comecinho de março. Tudo porque os partidos ainda não definiram quem fica com qual comissão nas duas casas. É aí que todo mundo se pergunta: e não deu para se organizar até agora? 

Depois de quatro dias de festa, ao menos os sobreviventes, geralmente “devotos de Nossa Senhora do Cartão de Crédito”, tem um motivo para comemorar: agora o ano começa para valer e por isso, “feliz Ano Novo”, de novo!

“Você pensa que cachaça é água?” 

Pois é, “cachaça não é água, não”. Enquanto o país é construído o ano inteiro, de obra em obra, com muito suor e blocos de cimento, o carnaval é feito por bloquinhos de rua, cheios do bom humor e do jeitinho brasileiro. Enquanto o Rio de Janeiro tem o “É Mole, mas Estica” e também “Quem Me Viu Mentiu”, São Paulo conta com os geniais “Samby e Junior” e “Arrianu Suassunga”, brincadeira com o escritor Ariano Suassuna. E não para por aí: se Olinda tinha o “Eu tô Liso, mas tô na Mídia”, em Recife teve bloco até para roqueiro, o “Bumba Meu Bowie”. Fortaleza contribuiu para o folclore carnavalesco com “Sou Brega Mais Quem Não É?”, quase primo do “Ai Que Saudade do Meu Ex”, de Porto Alegre. Mas e Brasília? 

Depois de muito tempo na base do “Bloco do Eu Sozinho”, hoje tem carnaval lá também, como comprova o bloquinho “Ministério do Namoro”. Só que não era assim no início dos anos 1960. Então, como o presidente Jucelino Kubitschek convenceu os senadores e deputados a trocarem o Rio de Janeiro, umas das cidades mais bonitas do mundo, cheia de praias, terra do samba e do Maracanã, pelo calor e monotonia do que ainda era o “meio do nada”? Simplesmente porque multiplicaram os “penduricalhos”, que deveriam ser provisórios para a transição, mas estão por aí até hoje. Incluindo os recessos para que todo mundo viaje, porque ninguém queria ficar e Brasília. 

Mesmo com Distrito Federal se tornando tão desenvolvido quanto as principais capitais do país, as mordomias continuaram, como os altos salários, acrescidos de auxílios para moradia e deslocamento. Porém, infelizmente essa não é uma falha exclusiva dos políticos. É só pensar: quantos votariam para se aposentar mais tarde ou ganhar menos? A resposta não é bonita, mas ainda é a nossa realidade.

No mais, enquanto o carnaval dá seus últimos suspiros na Bahia, entre as escolas de samba do Rio de Janeiro, venceu a Imperatriz Leopoldinense e, em São Paulo, a Mocidade Alegre. Agora que o ano realmente começou, resta ao povão torcer pelas escolas do país, em especial, pela escola… pública. Que um dia sejam como as de samba: “nota deeez”!

Fernando Ringel, jornalista e professor universitário


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