Em julho de 2017, na cidade de Curitiba-PR, a filha de um importante Deputado Federal, então Ministro da Saúde do Governo Temer, e da então Governadora do Paraná, casou-se. O enlace de gala aconteceu em um cenário peculiar, na Igreja do Rosário, Centro Histórico de Curitiba. Em estilo barroco, o templo foi construído por frades franciscanos para relembrar uma igreja que, no mesmo local, era utilizada por escravos proibidos de frequentar as missas dos brancos – a igreja original se chamava Igreja do Rosário dos Homens Pretos de São Benedito.
A festa foi no palácio Palácio Garibaldi, outro patrimônio histórico, originalmente construído por uma Liga de Trabalhadores italianos e incorporado ao patrimônio público na década de quarenta. No local da recepção, para receber a elite nacional e regional, foi realizada uma série de alterações no prédio que é tombado como patrimônio histórico. O caminho entre a cerimônia e a festa, cerca de cento e cinquenta metros, os noivos e os convidados fariam a pé, desfilando aos brilhos e paetês.
O casamento, meio cringe ou demodê para uma uma República moderna, seria notícia apenas nas colunas sociais. Contudo, acabou ganhando as páginas de política e de polícia, pois parcela da população descontente decidiu aparecer e atrapalhar o casamento da sinhazinha. Uma chuva de ovos invadiu a festa, caracterizada como um casamento ostentação.
Na semana passada a família paranaense voltou ao noticiário político nacional. O imbróglio político da vez foi motivado pela denúncia de um funcionário de carreira do Ministério da Saúde, irmão de um deputado federal ex-bolsonarista, de que havia um esquema de corrupção na pasta envolvendo a compra de vacinas produzidas na Índia, a Covaxin. As denúncias atingiram de cheio o Deputado federal Ricardo Barros (PP/PR), líder do governo Bolsonaro.
Barros é conhecido não só pela sua habilidade de atuação nos bastidores de Brasília. Mas por defender pautas como a diminuição do estado, o nepotismo no serviço público – sim, o líder do governo defende que os políticos tenham o direito de contratar seus parentes – a retirada de direitos sociais previsto na constituição brasileira, a diminuição do SUS e os interesses dos planos privados de saúde. No início do governo do genocida, o deputado chegou a advogar por uma nova constituição.
Ricardo Barros é oriundo de um feudalismo político. O pai foi prefeito de Maringá, no norte do Paraná, ele e seu irmão também ocuparam o mesmo cargo. Este é seu sexto mandato como Deputado. Barros já foi Secretário de Estado do Paraná e Ministro da Saúde. Sua mulher já foi vice-governadora do estado e chegou a chefiar o executivo quando o governador Beto Richa (PSDB) foi afastado por corrupção. A sua filha, a sinhazinha do casamento, está no segundo mandato na Assembleia Legislativa do Paraná.
Sim, política no Brasil é um negócio de família. A frase, que é um jargão no meio político, resume o conceito de patrimonialismo definido pelo sociólogo alemão Max Weber. Francisco de Oliveira, um sociólogo brasileiro, dizia que por aqui, a república é uma espécie de federação de coronéis regionais. Patrimonialismo é uma forma de exercício da dominação por uma autoridade, na qual o processo de legitimação acontece por meio da tradição. As principais características repousam no poder individual do governante que, amparado em um aparato administrativo recrutado com base em favores pessoais, exerce o poder político sob um determinado território. Esse tipo de relação de poder, que era dominante em regimes monárquicos, caracteriza-se pela confusão entre o que é público e privado, quando um governante atua como se o patrimônio público compusesse seu patrimônio privado.
Conhecendo a trajetória do político paranaense não é de se estranhar quando uma Comissão Parlamentar de Inquérito encontra as suas digitais em desvios de recursos que deveriam ser usados para a saúde da população. A elite política nacional é assim: cafona, anti-republicana e anti-povo. Ela sonha viver em um estado absolutista e utiliza as estruturas do estado como se fossem seu patrimônio privado. Para si o estado máximo, para a população o estado mínimo.
Um digno representante da nossa elite, perfeitamente afinada com a “desgraça” abrigada no poder central.
bom texto